Justiça Federal cancela termo de compromisso do Ibama com a Norte Energia por falta de estudos técnicos
Por: Villian Nunes
A Justiça Federal cancelou o termo de compromisso entre o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente (Ibama) e a Norte Energia, concessionária da hidrelétrica de Belo Monte, oeste do Pará, que previa o desvio de 80% das águas do rio Xingu para as turbinas da usina. Com a decisão, a hidrelétrica fica obrigada a aplicar um hidrograma provisório, liberando água suficiente para a manutenção da vida na região da Volta Grande do Xingu até que apresente estudos técnicos suficientes sobre os impactos do desvio do rio.
Em nota, a Norte Energia disse que ainda não foi notificada oficialmente da decisão e que “em 2022, caso prevaleça o hidrograma objeto da ação cível do Ministério Público Federal, isso significará uma perda de 1.800 MWh médios no ano, sendo que entre fevereiro e março a perda atingirá 6.000 MWh médios em cada mês”.
A empresa disse, também, que “a redução de geração da Usina Hidrelétrica Belo Monte provocada por este hidrograma representará um agravamento de cerca de 3,2% do Generation Scaling Factor (GSF), e perdas estimadas para o Sistema Interligado Nacional (SIN) da ordem de R$ 3,5 bilhões. Essa queda de geração de energia deixará de contribuir com cerca de 7,5% dos reservatórios do Sistema Interligado Nacional”.
A decisão atende a pedido do Ministério Público Federal (MPF) e considera que, ao assinar o termo de compromisso, o atualmente afastado presidente do Ibama, Eduardo Bim, deixou de considerar pareceres de sua própria equipe técnica – que atestavam a inviabilidade do desvio das águas do Xingu – e desrespeitou o princípio da precaução ambiental, que baliza o licenciamento ambiental no Brasil. De acordo com a liminar, quando se trata de atividades com potencial de causar danos ao meio ambiente a administração pública só pode agir de acordo com critérios técnicos.
A Justiça Federal estabeleceu que, também com base no princípio da precaução, até que os estudos técnicos estejam prontos e atestem a segurança hídrica para os ecossistemas do Xingu, o Ibama e a Norte Energia devem aplicar vazões mínimas suficientes para inundar as florestas aluviais e assegurar a alimentação e reprodução de espécies aquáticas, bem como a segurança alimentar dos moradores da Volta Grande.
Essas vazões mínimas, que compõem o chamado hidrograma provisório, definido pelo próprio Ibama em 2019, devem ser garantidas enquanto não forem estabelecidas as vazões seguras a serem praticadas na Volta Grande do Xingu, estabeleceu a Justiça Federal. A decisão judicial tem pequeno impacto imediato sobre a produção de energia da usina de Belo Monte porque, a partir de junho, o Xingu está em regime de seca e a geração de energia é mínima até o próximo período de cheia.
Estudos complementares
A decisão também ordenou que as vazões seguras devem ser determinadas por estudos complementares que a Norte Energia deve apresentar até o final deste ano, com prévia apresentação de cronograma para cada um dos três eixos desses estudos, definição de datas que considerem os diferentes ciclos hidrológicos, apresentação e publicidade de resultados parciais, e aprovação por parecer técnico do Ibama.
A Justiça Federal determinou, ainda, que, ao avaliar os estudos que vão redefinir quais são as vazões seguras – na teoria, essas vazões tinham sido definidas em um hidrograma estabelecido em consenso entre o governo federal e a Norte Energia, mas na prática o chamado hidrograma de consenso mostrou-se inviável –, o Ibama está obrigado a adotar premissas essenciais.
As premissas relacionadas pela Justiça Federal são o dever de manutenção dos ecossistemas, dos modos de vida e da navegação na Volta Grande do Xingu, o respeito ao princípio da precaução, a tecnicidade das decisões, o respeito ao princípio da informação e da transparência, e a consulta Prévia, Livre e Informada das populações tradicionais moradoras da Volta Grande do Xingu.